O livro de Tracy Chevalier é um romance, ficção sobre a vida de Johannes Vermeer, pintor holandês do século XVII. A narrativa trata da relação de Griet, uma empregada da família, com o pintor. Dentro do cotidiano de uma familia católica de uma cidade holandesa(onde a maioria era protestante) surge uma estranha relação de Griet com seu patrão, de admiração e temor entre ambos.
A jovem empregada, filha de um azulejista, tem noções de arte e cores e isto a torna muito especial aos olhos do pintor. O livro não mostra muito o pintor, pis pouco se sabe da verdadeira vida dele, a personagem Griet é a base para reconstrução da época.
Sobre a educação visual da narradora(Griet)
No começo do livro temos a seguinte passagem:
“- Vejo que separou os brancos – disse ele, indicando os nabos e cebolas. – Depois, o laranja e o roxo não estão juntos: por quê? – Pegou uma tira de repolho e uma rodela de cenoura e misturou-os como dados na mão.
Olhei para minha mãe, que concordou discretamente num gesto de cabeça.
- As cores brigam qunado ficam lado a lado, senhor.
Ele franziu o cenho, como se não esperasse aquela resposta.”
Há dois aspectos a observar, sendo a família Vermeer mais abastada que a de Griet há uma delicada maneira ao responder a pergunta; e a outra pode parecer banal mas poucas pessoas prestam atenção à maneira como as cores dos alimentos são colocados no momento do preparo mas na estória ilustra muito bem que a moça tinha uma clara noção de hierarquia e composição de cores. Em certo ponto, Griet compreende que a luz da janela mudaria o aspecto do quarto de pintura, coisa que uma pessoa leiga como a esposa do pintor não conseguia entender. Apesar de uma educação simples, Griet sabia descrever com riqueza de detalhes e com uma compreensão das sensações que a pintura poderia transmitir. Aos poucos, Griet aprende o método de trabalho e descobre as ferramentas de pintura, como a caixa (câmara escura), a bexiga de porco, os pigmentos e óleo de linhaça. Não se explica de onde vem, mas esta educação que ela tem também se revelará mais adiante. Acaba influenciando a pintura de Vermeer, neste ponto ela diz:
“Achei que a cena estava muito limpa. Embora eu considerasse a limpeza a coisa mais importante de tudo, vi nos outros quadros que precisava haver alguma desordem na mesa, alguma coisa para distrair os olhos.”
Sua ansiedade aumenta a cada pincelada feita pelo pintor sem que ele tivesse feito a mudança que ela queria ( o que ela não explica diretamente para Vermeer) . Até que uma noite Griet altera a cena. Vermeer entende e segue a sugestão, mesmo respeitando a habilidade e a percepção ele a questiona:
“- Griet, diga uma coisa: por que você mudou a toalha da mesa? – O tom de sua voz era o mesmo de quando perguntou dos legumes, na casa de meus pais.
Pensei um instante. – Precisa ter alguma desordem na cena para contrastar com a tranquilidade dela –expliquei. – Para incomodar a vista e, ao mesmo tempo, agradar, pois a toalha e o braço estão na mesma posição.
Houve um longo silêncio. Ele estava olhando para a mesa. Espere, passando as mãos no avental.
- Nunca pensei que fosse aprender alguma coisa com uma criada – admitiu ele.”
Além da câmara escura, o pintor ensina a Griet como observar além das aparências, ao observar as nuances de cores das nuvens, ao observar a pintura panorâmica de Delft e assim ele consegue rapidamente fazer com que ela compreendesse como eram as etapas de elaboração da pintura, necessário para saber manipular os pigmentos
Sobre o ato de olhar
“- O que é uma imagem, senhor? Não conheço essa palavra.
Alguma coisa mudou no rosto dele como se antes estivesse me olhando por cima do ombro e de repente me olhasse de frente. – É um retrato, como um quadro.”
Estamos tão acostumados com imagens de todos os tipos desde crianças mas nem sempre se compreende o porque e qual a razão para estas. A pergunta que Griet faz é que ela não compreende que na câmara escura está apenas o reflexo do ambiente. Demonstra como um conjunto de signos pode ser deslocado de sua fonte original e passar a ter outros valores. No romance podemos ver esse deslocamento no quadro que inspira o livro, o brinco de pérola da mulher de Vermeer torna-se o pivô de uma crise entre os personagens. Ao ser usado pela criada o brinco passa a representar o amor ou veneração que ambos (Griet e Vermeer) teriam um pelo outro.
Referência:
CHEVALIER, Tracy; trad. de Beatriz Horta. “Moça com brinco de Pérola” 8ª ed. – Rio de Janeiro: Bertrando Brasil, 2005
GUEDES, Peonia Viana. Quando a arte, a história e a ficção se misturam:
os discursos e intertextos de A moça com brinco de pérola. Acessado em: http://paginas.terra.com.br/arte/dubitoergosum/convidado28.htm em maio de 2006.
segunda-feira, junho 19, 2006
Uma leitura sobre “Moça com brinco de Pérola”
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