Artes visuais Iniciativa de artistas da capital mostra que cooperação
é o caminho para divulgar produção
por Leandro Selister
Articulador de espaços da Bienal B
Artista plástico e editor do site Artewebbrasil
27 de agosto de 2007, Rio Grande do Sul, Porto Alegre, bairro Moinhos de Vento, Moinhos Shopping, praça de alimentação, discursos, mais de 450 pessoas, luzes, desfile de obras de arte: Os estranhos vestíveis, muitos aplausos. Iniciava-se assim oficialmente a Bienal B.
Na noite de abertura, entre agradecimentos e uma imensa alegria de estar participando ativamente desse momento, citei o professor e geógrafo Milton Santos (1926-2001) que, ao responder uma pergunta sobre como viver num mundo apressado como o nosso e criticá-lo ao mesmo tempo, disse: “O que se pode fazer é viver apressado, para garantir a subsistência, mas sem perder de vista a construção de um sonho. É o sonho que obriga o homem a pensar.”
Sonhar, pensar e construir: três palavras que representam muito para a Bienal B, um evento que se propôs a realizar cerca de 70 exposições, contemplando mais de 300 artistas em 40 espaços da cidade, revelando até mesmo alguns deles pela primeira vez, em um curto período de tempo – apenas três meses.
O começo – No início deste ano, o site da Bienal B entrou no ar, convocando todos os artistas interessados em expor seus trabalhos durante os meses de setembro, outubro e novembro. A inscrição era simples e rápida, bastando para isso, enviar por e-mail o currículo e fotos de três trabalhos. Em troca, o artista seria incluído no site e informado através dele de todas as novidades, prazos, montagens, eventos etc. A única certeza era que não existiam verbas, mas existia aquele velho sonho de construir algo novo e esse era o maior valor que possuíamos.
Em pouco tempo, a quantidade de inscrições e adesões cresceu, parceiros surgiram, a mídia foi descobrindo e revelando que alguma coisa muito diferente estava por acontecer em Porto Alegre. Diferente porque dependia de todos. Diferente porque ao mesmo tempo em que muitos não se conheciam, as redes começavam a se formar, e, no final do período de inscrições, o número de interessados ultrapassava a marca de 300 artistas.
Encerradas as inscrições, teve início a segunda etapa do processo – a seleção dos artistas. Gaby Benedict, artista plástica e articuladora geral da Bienal B, convidou para essa tarefa: André Venzon, artista plástico e presidente da Associação Francisco Lisboa, Isabel de Castro, artista plástica e professora do Instituto de Artes da UFRGS e ESPM e Leandro Selister, artista plástico e editor do site Artewebbrasil. A intenção de Gaby era discutir quais seriam os artistas selecionados. Naquele momento, o consenso foi de que nenhum dos inscritos no site seria excluído da mostra, pois na avaliação geral, o que realmente importava era o fato de que todos pudessem participar e viver esse momento. Os riscos e críticas dessa decisão eram inevitáveis, mas pretendíamos era proporcionar aos artistas o exercício real de um grande trabalho em grupo, de uma colaboração entre todos, Exercer enfim, aquela velha história: “se cada um fizer a sua parte tudo vai funcionar”. Hoje, com dois meses de exposições, podemos perceber que a decisão para aquele momento, foi a mais certa, e, que estamos construindo todos os dias a Bienal B.
Ação educativa – A Bienal B também teve a preocupação de discutir temas ligados à arte através de projetos como Papo Arte, no bar Joy Division, no qual encontros semanais coordenados por Lisiane Rabello discutiram a experiência cotidiana que todos temos com a arte, aproveitando a opinião de convidados e artistas; e o Língua de Artista, projeto de encontros quinzenais informal e dinâmico realizado na praça de alimentação do Moinhos Shopping com a coordenação de Isabel de Castro. O público tem comparecido e participado desses encontros, provando mais uma vez que para pensar e discutir o importante é a vontade efetiva de fazer isso.
Arte engajada – Uma estrutura de ferro, uma espécie de jaula, situada no primeiro andar do Moinhos Shopping chamou a atenção e mudou a rotina dos freqüentadores do centro de compras. Tratava-se da obra Lar doce lar, de Cláu e Beto, os CowBees. Ao abdicarem da privacidade de suas vidas, o casal se propôs a ficar literalmente trancado na jaula pelo período de 12 horas diárias durante 32 dias. Através de um computador os artistas relatavam diariamente a experiência em um blog na internet (http://www.cowbees.com/) permitindo ao público acompanhar o que eles estavam vivendo e sentindo com a experiência. Dois fones de ouvido e dois aparelhos de CD portáteis permitiram às pessoas que visitavam o shopping escutar a música Lar doce lar, que dá nome ao trabalho. Através de uma letra irônica e bem humorada e de uma apresentação final com muita emoção, os CowBees trataram de um assunto pertinente e urgente: a violência urbana. Criaram uma obra de arte que não passou despercebida e que sensibilizou o público. Uma obra que nos colocou frente a frente com imposições que sofremos de uma sociedade injusta e desigual e que, muitas vezes, não percebemos. Uma obra que convida à reflexão e à atitude. Como diz a letra: “... Que felizes vamos ser, na nossa doce prisão, não sairemos nunca mais, do planeta solidão”.
Os parceiros – Não poderia deixar de comentar sobre as parcerias que foram sendo construídas, e que certamente continuarão a existir e a se fortalecer para a próxima edição da Bienal B em 2009. Começando pelos 40 espaços expositivos que receberam as exposições num gesto que demonstra o entendimento e o apoio a nossa proposta. Ao Shopping Moinhos carinhosamente conhecido como o nosso âncora expositivo. Aos patrocinadores individuais de cada artista incentivando-os a mostrarem seus trabalhos. Ao apoio da Fundação Bienal do Mercosul, que possibilitou a impressão de 40 mil mapas da Bienal B, onde constam todos os endereços, apoiadores e artistas e a incrível campanha publicitária concebida pela Paim Comunicação com a chamada que traduz tudo aquilo que acreditamos: Bienal B – Outras Perspectivas. Sem a colaboração e o envolvimento desses parceiros, não teríamos conseguido realizar nada disso.
Para terminar ou querendo começar tudo de novo... É difícil avaliar um evento como a Bienal B, ainda tão novo, mas nem por isso, menos contundente e forte. Estou dentro dele desde o início. Acredito muito nele e sonhei que seria possível algo assim acontecer em Porto Alegre. Quando a última exposição encerrar vamos novamente nos preparar para sonhar, pensar e construir a próxima Bienal B, mas com uma diferença fundamental: estaremos mais maduros e experientes. Para terminar essa breve história, deixo aqui um dos anagramas criados para a campanha publicitária da Bienal B e que certamente será o sentimento de todos aqueles que estiveram envolvidos na construção desse projeto: te dar adeus – ter saudade.
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